quarta-feira, 24 de junho de 2009

Digam-lhes como é o amor

“Sou amante da arte de partilhar e esta aparentemente banal troca de nomes e lugares não é para todos. Foi uma amiga que tanto amo que me disse, “lê no jornal o artigo sobre Marcos Ana”, e eu fui ler, sedenta das palavras dos outros que dão sentido à minha existência. Esse homem que esteve 23 anos preso pelo regime franquista confessou ser um romântico: “para mim, o amor é a aventura mais apaixonante do ser humano…” Um homem que esteve preso mais de metade da vida que tenho, e depois dessa barbara injustiça diz uma coisa destas, merece a vida eterna.
Terá sido o Amor, a luz ao fundo da cela?
O Amor, (acentuo a maiúscula para o distinguir de tudo o que nos baralha) é só para os fortes. Tenho a certeza. Desculpem, mas tenho. Carregar a dor do risco pode ser penosa, mas será sempre mais gloriosa do que a dos que nada ousaram viver. Aquela malta fraquinha que me diz: “não tinha disponibilidade”, “ficava muito desprotegido” ou “ainda não era ele” (sendo o centésimo), merece quase um regime franquista – e perdoem-me o mau gosto desta utilização. Pessoas assim merecem ficar sozinhas para sempre, por não saber que é o Amor que nos salva e cujas feridas nos dão o antídoto para tudo o resto. E, já agora, nem distingo o amor! Mas aquele da paixão que dá filmes e livros é brutal (brutal é aquela palavra que os adolescentes freaks usam para adjectivar um concerto, ou uma “cena” marada. Mas brutal é o Amor quando nos vamos a ele).
Se hoje em dia pressentisse estar perante um Amor desses que não era vivido por temor do outro, era capaz de lhe furar os pneus ou partir-lhe os vidros da casa de design com uma fisga. Esta nova gente com muito dinheiro para o embrulho é, normalmente muito pobrezinha no conteúdo. Conhece este e aquele, mas não conhece ninguém que permita conhecê-los. E assim regressam a casa, na solidão penosa mas inconsciente da falta de disponibilidade para amar. Para partilhar.
Eu lamento a sua fraqueza, mas sobretudo a ideia de atravessarem a vida inteira sem conhecerem esse sentimento que nos tira do chão e nos deixa sem nome.
Se perguntarem aos vossos em redor se voltariam a viver as histórias de Amor a que se entregaram, sei que muito raros seriam os que diriam não. Antes sofrer por uma nega, que sofrer por nada, pelo vazio. Pelo coração frouxo.
Assisto quase incrédula (felizmente o coração já me deu defesas para tanto) ao encontro de duas pessoas – que eu diria serem talhadas uma para a outra. Tão bonitas, tão harmoniosas. Mas não, a chatice do Amor é bastar haver um que não quer ou não investe, para o par se dissolver. Uma efervescência negativa, que ninguém quer beber.
Uma delas afasta-se, vai para longe, dá muitos sinais de interesse, mas foge na hora da verdade. Se fosse comigo (e tantas vezes aconteceu no passado) dava comigo em doida. Em pessoas assim apetece-me dar-lhes uma tareia. Será que ao ser-se cobarde no Amor pode ser-se forte no resto? Ou o problema dos românticos é precisamente esse, o de se desgastarem demasiado na entrega desmedida ao Amor?! Serão os românticos pouco ambiciosos? Agora que penso, faz sentido. Mas posso contrariar uma máxima por mim inventada agora mesmo: quem muito ama, pouco alcança.
Eu acredito que a luz persegue os que amam.
Volto por isso ao Marcos Ana, 89 anos, 23 dos quais passados numa prisão. O homem que tudo indica, dará um filme de Almodôvar não se intimidou com a reclusão e apregoa ao mundo ser um romântico.
O Amor é muito mais forte que a injustiça. Mesmo quando o motivo da injustiça é sempre um dos dois.
Da próxima vez que apanharem um(a) paspalho(a) que fuja do que têm para lhe dar, ofereçam-lhe uma última coisa: o livro de Marcos Ana – Digam-me como É Uma Árvore. Talvez os que sofrem dessa incapacidade que é não saber amar descubram a libertação.
Oh God, make me good, but not yet!”

O sexo e a Cidália in Notícias Sábado' 20 Junho 2009

(Lagos)

1 comentário:

Anónimo disse...

Agora, com MUITO mais calam, consegui lê lo.
À medida que ia cruzando as palavras, só pensava em mim. (perdoem m o egoísmo!)
Há qq coisa de FUERZA BRUTA.

Porto.